Por Oscar D’Ambrosio
Imagine um ator alemão perdido em Botswana sem falar nenhuma palavra das línguas nativas. Imagine ainda que aquele que lhe serve de guia falece de repente à noite. E, para completar, o filho desse guia acredita que, de algum modo, o europeu está relacionado com essa morte, seja na questão física ou na espiritual, por não ter conseguido conservar o corpo.
Todas essas variáveis, e outras naturalmente, estão em “The River Used To Be A Man”, obra dirigida por Jan Zabeil, que tem como roteiristas o próprio diretor e Alexander Fehling, o principal ator dessa saga. As dificuldades do protagonista colocam-se muito além da língua. Passam pela maneira de suportar o sol e de remar a canoa, entre dezenas de fatores
Todos esses detalhes se tornam mais presentes quando o ator passa a estar só. Mal consegue mover a embarcação e o desconhecimento da língua traz consigo a ignorância de tradições e comportamentos que podem indicar ser bem ou mal recebido pela comunidade local. O ambiente torna-se mais inóspito à medida em que códigos de conduta também são ignorados.
Sem a presença de música incidental, regido pelo ambiente, com suas múltiplas sonoridades do fluir da água do rio, da chuva repentina e breve e do crepitar da fogueira, o filme mostra claramente que dialogar com outra cultura é muito mais do que um falar. Está nos detalhes que dão vida às mais diversas ações. É nos pequenos fatores que os grandes saltam aos olhos.
Oscar D’Ambrosio é jornalista pela USP, mestre em Artes Visuais pela Unesp, graduado em Letras (Português e Inglês) e doutor em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.