Por José Ambrósio*
Os escombros do Teatro Barreto Júnior compõem um cenário revelador do abandono a que está relegada a Cultura no Cabo de Santo Agostinho. Um retrato em preto e branco, desbotado, sem moldura, jogado às traças.
Atores e atrizes ali reveladas, hoje, para encantar o público precisam se apresentar em outras cidades e outros estados. Aplausos de conterrâneos na sua terra somente em palcos pouco adequados para a arte de Bertold Brecht, na memória e em vídeos.
A casa de espetáculos saiu de cena há cerca de seis anos, em razão de um curto-circuito. Abandonado, sofreu um incêndio em maio de 2017. Desde então as ruínas só aumentam.
E pensar que no palco do Teatro Barreto Júnior – considerado um patrimônio da cidade – já se apresentaram artistas do porte de Zé Geraldo e grupos como o Teatro de Amadores de Pernambuco, além de outros de muitos estados em festivais como o Festival Nacional de Teatro do Cabo. O Barreto Júnior abrigou o Festival de Arte e também exposições no Salão de Artes, espaço anexo dentro do teatro e local onde o artista plástico João Brito ministrava aulas de pintura para cerca de oito dezenas de jovens e formou vários talentos, a exemplo de Berg, conhecido nacionalmente. Com a sua arte, ajudou (a) a botar mais cores nas vidas de muitos jovens.
Saudades de Antonino Júnior (falecido), Graça Oliveira, Francisco Alves (falecido), Evânia Copino, Alonso, Lu Oliveira, Zezinha e tantos outros nomes que desfilaram seus talentos pelo palco do Teatro Barreto Júnior.
Também foi retirado de cena o direito dos cabenses de aplaudirem outros grupos teatrais, outras culturas, intercâmbio fundamental na formação de uma cidadania plural e pulsante. Grandes espetáculos, nunca mais.
Isso tudo dá uma tristeza, uma dor enorme. Fico pensando sobre o sentimento de parentes de Barreto Júnior que ainda residem no Cabo em relação ao descaso com aquele patrimônio, especificamente. Sim, há parentes dele residindo na terra do cabense Barreto Júnior. Nascido no Cabo de Santo Agostinho no dia 05 de maio de 1903, no início da carreira atuou em filmes da companhia cinematográfica pernambucana Aurora Filmes, tendo participado do primeiro filme realizado em Pernambuco, Retribuição, em 1923. Em 1937 transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde residiu por dez anos e organizou a Companhia Nacional de Comédias Barreto Júnior com a qual viajou por todo o Brasil. José do Rêgo Barreto Júnior faleceu no Recife no dia 21 de fevereiro de 1983.
Sem estímulo e sem apoio, a Cultura míngua, grupos se desintegram, artistas migram. Ao mesmo tempo, sem atividades culturais, aumenta a vulnerabilidade da juventude a encantos que somente levam a desencantos.
O que antes era um “Ponto de Cultura” que aproximava pessoas e a muitos encantava, agora é ponto de drogas e muitos evitam passar nas proximidades, principalmente na rua lateral e na rua de trás, por medo do que alguns chamam de covil, pois as ruínas também são utilizadas como esconderijo. Já houve até tiroteio no local.
Como isso pode acontecer e o que é ainda pior, perdurar?
Talvez a explicação não seja tão difícil. Basta lembrar que no organograma da Prefeitura do Cabo não há sequer uma Secretaria Executiva de Cultura, apenas uma Gerência de Cultura.
Cultura? Para que Cultura? É assim que devem pensar os integrantes do chamado “núcleo duro” da gestão. “Iluminados” que acreditam serem os reclamos capricho de poucos e que quem reclama com mais ênfase é opositor militante. Avaliam que se estão há 15 anos no poder é porque o povo cabense tem a Cultura que merece.
Assim, a luta, os protestos e as reivindicações da classe artística pela revitalização do Teatro Barreto Júnior ficam no vazio. No vazio de uma gestão que tem como política cultural a aversão a tudo que possa despertar, instigar e principalmente aguçar o senso crítico.
*José Ambrósio é jornalista e membro da Academia Cabense de Letras
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